Fake News _ Comunicação Integrada _ Luís Paulo Rodrigues
Internet
22-01-2020

Desinformação e "fake news". A educação como meio de combate

LUÍS PAULO RODRIGUES

Como vivemos na sociedade da comunicação, em que estamos todos conectados em rede, imersos num espaço sem fronteiras em que todos comunicam com todos à escala global, torna-se fundamental, nas escolas de todo o mundo, adoptar uma estratégia contra a desinformação e as “fake news” baseada numa aposta séria e determinada no ensino da educação mediática (“educação para os media”, na era anterior à Internet).

Para além da formação de cidadãos melhores e mais participativos, está em causa o objectivo nobre de combater a iliteracia digital (que é o analfabetismo do nosso tempo) e preparar os cidadãos para a realidade complexa em que vivem, tornando-os mais informados, esclarecidos e conscientes, quer seja na sua relação com o poder político, no mundo dos negócios digitais ou na vida quotidiana.

No passado, a iliteracia não se notava muito porque era preciso ir ao quiosque e pagar para ler o jornal ou a revista. A televisão, com escassas opções de canais, era consumida de forma passiva. Mas hoje, com os telemóveis baratos e praticamente indispensáveis, a informação está disponível a todos, chegando até nós sem pedir licença em doses gigantescas. A informação e, também, a desinformação…

Aliás, muitos políticos valem-se precisamente da informação falsa – as “fake news” – ou da imagem adulterada em computador não só como estratégia de comunicação política para ganhar eleições como para governar. Obviamente, “fake news” e adulteração de fotografias houve sempre. Agora, a capacidade de difusão em grande escala transforma uma notícia falsa num problema potencialmente sério. E a produção de falsidades é de tal ordem que os novos meios de jornalismo de verificação de factos (“fact-checking, em inglês) não têm mãos a medir. Em Portugal, o “Polígrafo” é um bom exemplo.

O recurso às “fake news” e ao ataque pessoal como arma de arremesso político, explorando o lado mais negro dos adversários, tornou-se uma prática de comunicação banal que intoxica o espaço público mediático. Assim como a comunicação directa com os eleitores, em que políticos e governantes fogem aos debates e ao filtro do jornalismo e falam directamente aos eleitores, através das redes sociais. Donald Trump, nos Estados Unidos, e Jair Bolsonaro, no Brasil, são dois mestres desta nova arte proporcionada pelo ambiente digital. Porque eles sabem que os públicos estão cada vez mais nas redes sociais e cada vez menos na televisão.

Num livro ainda sem edição portuguesa que acaba de ser lançado em França, justamente intitulado “A Era do Choque”, Christian Salmon, um investigador sobre o discurso político contemporâneo, aborda o fenómeno da comunicação política e da sua transformação em função das novas possibilidades proporcionadas pela Internet e pelas redes sociais.

Face a este quadro, considero que só a educação pode ajudar a formar cidadãos melhores, que saibam consumir informação sabendo distinguir entre fontes falsas e fontes verdadeiras ou entre ataque político ou ataque meramente pessoal. Só a educação pode ajudar a distinguir a capacidade manipuladora de um texto, um som ou uma imagem. A questão é simples: se a classe política eliminou a capacidade filtradora do jornalismo, ao comunicar pelas redes sociais, torna-se necessário transferir essa capacidade de filtrar para os cidadãos.

A produção de informação em quantidades gigantescas está a causar problemas na recepção, por causa do excesso de informação e da necessidade de filtrar o que interessa, ignorando o que não interessa ou que é falso.

Assim, num futuro cada vez mais próximo, uma nova profissão deverá emergir para dar a emprego a pessoas que filtrem a informação que o cliente deve ler. Porque as máquinas ainda não fazem tudo. Obviamente, terá acesso a esse serviço quem tiver interesse e capacidade financeira para o adquirir.

Antigamente, só era necessário ter uma assessoria de imprensa para emitir a informação e as mensagens do político, da empresa ou da organização. Os meios de comunicação de massa faziam a difusão para muita gente ao mesmo tempo, através do jornal, da rádio, da televisão ou da revista.

Nesse tempo, que não foi há muito tempo, eram muito poucos a produzir e a difundir informação. Havia muito mais receptores do que emissores de informação. Agora, todos nós podemos produzir e emitir a nossa própria informação. E podemos dar opiniões que são capazes de influenciar a nossa rede de ligações pessoais.

O espaço público mediático está, portanto, cada vez maior e cada vez mais complexo. Importa, por isso, formar cidadãos informados e conscientes. Porque quanto mais informados e conscientes forem mais liberdade e mais capacidade terão para escolher o que precisam.

Obs.
Artigo publicado no jornal "Meios & Publicidade", de 20 de janeiro de 2020. Link original: https://bit.ly/3asUXS6.
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