Manuel Castells
Internet
20-07-2018

Manuel Castells: "As redes sociais estão mais fortes do que nunca"

Aos 76 anos, o espanhol Manuel Castells, sociólogo e teórico da comunicação, distingue-se de outros intelectuais contemporâneos pelo otimismo em relação ao fenómeno da Internet e das redes sociais. Ele defende que redes como o Facebook, Twitter, Telegram e outras formas de organização por meios digitais estão a transformar o mundo, e para melhor.

Em sua opinião, as distorções e explorações serão normalmente corrigidas, até que o planeta atinja um nível de interação completa.
Mesmo assim, Castells teme pela sobrevivência do sistema democrático, sobre o qual faz uma reflexão no livro “Ruptura — A Crise da Democracia Liberal”, que acaba de ser lançado no Brasil pela editora Zahar.

No livro, Manuel Castells analisa a crise de representatividade que toma conta do mundo, em que as populações de eleitores se sentem órfãs dos políticos que os deviam supostamente representá-los. Foi isso que, em sua opinião, corroeu a construção da União Europeia e tem gerado conturbações no velho continente e no mundo.

Numa entrevista concedida à revista brasileira “Isto É”, publicada em 13 de julho último, Castells aponta saídas para as trevas em que o planeta está mergulhado. Destaco as opiniões de Manuel Castells sobre a Internet e as redes sociais. E no final, deixo o link para a entrevista integral. Boa leitura!

“Os cidadãos em todos os países e na sua grande maioria não acreditam que os partidos, os parlamentos e os governos possam representá-los. Esses são os dados de fontes diversas reunidas na minha pesquisa, que estão presentes na internet e acompanham o meu livro. A representação é ilegítima porque a designação dos representantes está condicionadas por leis eleitorais condicionadas pelos principais partidos, pelo financiamento ilegal que esses partidos obtêm e pela manipulação de opinião no processo de comunicação."

“A ruptura é a ruptura da democracia, ou seja, a separação entre governantes e governados, que é a negação da representação e, portanto, da democracia.”

“A democracia liberal, um determinado modelo histórico de democracia, está a autodestruir-se pela sua própria prática corrupta. Não é uma crise externa e sim interna. (…) A judicialização da política elimina a separação de poderes, que era a base da democracia liberal. Ela é a causa principal da crise institucional. Ela acontece em muitos países, mas, no Brasil, é muito mais brutal e mais direta, com objetivos diretamente políticos da parte do poder judicial.”

“As redes sociais estão mais fortes do que nunca em todos os países. Elas são o modo privilegiado da comunicação em massa na sociedade. Todos estamos nas redes. Mas, precisamente por isso, não há apenas progressistas e forças de mudança social. (…) Também há no mundo neonazistas, xenófobos, racistas, sexistas. E milhões de robôs, gerados por forças ocultas, para ampliar as mensagens mais retrógradas e provocar confrontação social.”

“A manipulação informativa sempre existiu. Lembre-se da reportagem do ‘The New York Times’ que afirmava que havia armas de destruição em massa no Iraque.”

“(…) Aqueles que quiserem evitar a destruição da convivência social têm que estar presentes e lutar nas redes sociais com suas próprias mensagens. As redes são mais importantes do que nunca.”

“Como disse o fundador da Sun Microsystems há muito tempo, não é possível a privacidade na era da Internet. Mas a internet pode ser utilizada para defender a liberdade.”

“A Internet é para nossa sociedade em rede o que a eletricidade foi para a sociedade industrial. É a tecnologia básica que permite a comunicação em todas as dimensões. Portanto, como a comunicação é a essência da vida social, económica e política, a Internet é essencial e continuará sendo. A Nasa já está projetando a Internet interplanetária e interestelar. Aqui na Terra, estamos desenvolvendo de maneira muito rápida a “Internet das Coisas”, que conecta máquinas com máquinas sem intermediação humana.”

“Há formas tecnológicas e combater as ‘fake news’. Até mesmo corporações como o Facebook estão gerando programas, assim como diversos centros de investigação. Mas o essencial é a educação e a informação dos cidadãos para que possam ter o seu próprio critério. A começar pelos jornalistas. Na minha Escola Annenbert de Comunicação e Jornalismo de Los Angeles, estamos realizando seminários para capacitar os estudantes na deteção das ‘fake news’ e na contrainformação da desinformação.

“O Facebook continua a ser importante para todos porque tem 1,5 mil milhões de usuários com quem precisamos nos comunicar. Mas hoje em dia existem muitas redes alternativas que não estão sob seu controlo. Isso vai se multiplicando. Por exemplo, o Facebook comprou o WhatsApp, mas agora os ativistas usam aplicativos como Signal e Telegram. Por isso, os tribunais russos estão tentando fechar o Telegram. Mas, tão logo conseguem isso, criam-se outras redes. A resistência tecnológica acompanha a resistência social. No longo prazo, ganha a liberdade.”

“[No Mundo], estamos vivendo tempos extremos e perigosos. São interessantes para aqueles que desfrutam de emoções fortes sem pensar nas consequências. Certamente nos Estados Unidos não há uma vitória conservadora porque Donald Trump derrotou de uma só vez democratas e republicanos. O que existe é um demagogo populista xenófobo, racista e sexista, eleito pelo voto de brancos assustados pelas minorias e pela imigração. Mas uma batalha está em curso. Acaba de ser eleita uma porto-riquenha esquerdista de 28 anos, Alexandria Ocaso-Cortez, como possível congressista democrata em Nova York.”

“O Facebook é uma rede social com o objetivo de obter lucros empresariais que dependem fundamentalmente do aumento de tráfego e da captação de dados que podem ser vendidos. Ou seja, como rede, trata-se de um sistema de comunicação. Como negócio, naturalmente, é comercial e seu negócio não é a comunicação, e sim o negócio de dados.”

“As redes sociais digitais (…) fazem parte da esfera pública, mas com biliões de participantes na interação. Jürgen Habermas havia previsto essa situação. A nostalgia dos intelectuais pela inocência anterior, além de ser inútil, ignora que, antes, a comunicação estava controlada por governos ou empresas de ‘media’.”

Obs. – Link para o conteúdo integral da entrevista de Manuel Castells à revista “Isto É”: goo.gl/ZCUGvP.
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