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15-08-2016

Michel Temer, o presidente mal-amado

LUÍS PAULO RODRIGUES

O presidente interino do Brasil, Michel Temer, não é um político bem-amado pelos brasileiros, ao contrário do prefeito da imaginária cidade nordestina de Sucupira, Odorico Paraguaçu, um político cheio de artimanhas, imortalizado pelo ator Paulo Gracindo na telenovela "O Bem-Amado", escrita por Dias Gomes, tendo sido a primeira que as televisões mostraram a cores, produzida e exibida pela Rede Globo, na primeira metade da década de 1970.

Na excelente cerimónia de abertura dos Jogos Olímpicos do Rio de Janeiro‬, que reabilitou o Brasil como país organizador de grandes evento mundiais, o Presidente da República, que é líder nacional do PMDB (Partido do Movimento Democrático Brasileiro), não discursou nem foi anunciado publicamente no Maracanã, quando chegou a hora de o próprio, enquanto anfitrião, declarar as Olimpíadas abertas.

A discrição de Temer, na presidência do Brasil desde Maio último, depois de ter sido conivente com todas as decisões do Governo de Dilma Rousseff, de quem era vice-presidente, tinha um motivo muito especial: ele queria evitar as vaias do público. E não se pense que era público do PT ou beneficiário do programa social Bolsa Família. Era público com poder de compra para estar presente numa cerimónia de abertura das Olimpíadas.

Vinda do nada, a voz de Temer lá declarou os jogos abertos. Foram poucos segundos. Tal como pedira, o seu nome não foi anunciado, mas, mesmo assim, ouviu vaias ruidosas. E na tribuna do estádio não havia outros políticos brasileiros com quem pudesse dividir essas vaias.



Este episódio revela que Michel Temer não tem vida fácil na liderança do Governo e parece não ter força política para pacificar o país. A expressão “Fora Temer” tem sido exibida nos Jogos Olímpicos por brasileiros mais ativos politicamente. Nos primeiros dias dos Jogos, essas manifestações pacíficas foram censuradas com a expulsão dos seus autores dos espaços desportivos, dando uma má imagem do país. Mas no dia 8 de agosto, em decisão liminar, um juiz federal determinou proibir a repressão de manifestações pacíficas de cunho político em locais dos Jogos (mais informações aqui: http://goo.gl/8fyC37).

Temer vai dizendo que em 2018 não se candidata (na verdade, ele não pode), mas nem assim é tolerado por muitos brasileiros. Isso demonstra que, a poucos dias da decisão sobre o processo de destituição da presidente suspensa Dilma Rousseff, do PT (Partido dos Trablhadores), o Brasil continua um país dividido.


Dias antes da abertura dos Jogos Olímpicos – evento que representa um modelo de afirmação do Brasil no mundo preconizado pelos Governos de Lula da Silva –, e para adocicar a sua imagem junto dos brasileiros, Michel Temer foi à escola primária buscar o filho, como se fosse um pai brasileiro como qualquer outro. Foi um tiro de comunicação que saiu pela culatra: o que foi notícia na imprensa e nas redes sociais é que a assessoria de comunicação de Temer chamou os repórteres à escola para que fotografassem e filmassem o momento paterno do presidente.

Michel Temer, recorde-se, está proibido pela justiça eleitoral de se candidatar nas eleições presidenciais de 2018. No léxico da política brasileira ele é considerado "ficha suja e inelegível", nos próximos oito anos. Antes de assumir a presidência do país, Temer foi condenado pelo Tribunal Regional Eleitoral de São Paulo por ter extrapolado o teto legal para doações de campanha, nas eleições estaduais de 2014.

O nome de Temer também apareceu nos últimos dias associado ao processo de corrupção Lava Jato. No dia 6 de agosto, através da revista Veja, os brasileiros ficaram a saber que o empresário Marcelo Odebrecht, líder de uma das maiores construtoras da América Latina, atualmente preso, confessou, no âmbito da Operação Lava-Jato, que repassou 10 milhões em dinheiro ao PMDB, em 2014, a pedido do presidente em exercício Michel Temer. A informação não foi desmentida pela assessoria de Temer, que, no entanto, lembrou que todo o dinheiro repassado pela empreiteira estaria de acordo com a legislação eleitoral (mais informações aqui: http://goo.gl/h3Qhxo).

Por tudo isto, Michel Temer
não está com a vida nada facilitada na presidência interina do Brasil. É um presidente mal-amado pelo povo e acossado pelo fantasma do processo Lava Jato. A expressão "Fora Temer" que tem sido vista sob diversas formas durante as Olimpíadas do Rio não tem nada a ver com os Jogos Olímpicos, que, contra as previsões mais pessimistas, até estão a correr bem, demonstrando, mais uma vez, que o Brasil sabe organizar grandes eventos mundiais.

Ninguém fala em desorganização, em obras por acabar, em insegurança ou em ataques terroristas. E o Brasil mostra ao mundo o que tem de bom. Vaias, só mesmo para o presidente.

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