Marketing
10-12-2015

O cliente atual tem de ser encarado como um amigo para toda a vida

LUÍS PAULO RODRIGUES

Uso óculos para ler e sou daquelas pessoas que estão sempre a tirar e a pôr os óculos. Na verdade, embora os óculos sejam de lentes progressivas, permitindo ver ao longe e ao perto com a mesma qualidade, acabo sempre por tirá-los quando tenho a perceção de que vejo melhor ao longe sem eles, nomeadamente quando estou na estrada a conduzir o automóvel. Esta utilização permanente da caixa dos óculos ao longo do dia, acaba por desgastá-la muito rapidamente, não obstante o material relativamente resistente com que foi produzida.
Há dias, ao fim de dois anos de utilização diária, comecei a reparar que a caixa estava demasiado desgastada para acolher os meus óculos da Prada. Pensei, então, que talvez a marca italiana tivesse para venda caixas de substituição para clientes com o mesmo problema. Fui à loja multimarcas onde comprei os óculos, da rede Ópticas New Look, em Vila Nova de Famalicão, e perguntei se tinha uma caixa nova para venda. A pessoa responsável da loja foi verificar, confirmou que tinha e fez a troca. Não paquei nada pela transação. Apenas deixei lá a minha caixa velha.
Um gesto simples, que valorizei muito. Depois desta experiência positiva e surpreendente, saí da loja convencido de uma coisa: na próxima vez, quando precisar dos serviços de uma loja de ótica, irei à mesma loja. Na verdade, a funcionária das Ópticas New Look poderia ter feito um preço para a nova caixa que eu não iria contestar, pois queria o meu problema resolvido. Mas ao ter disponibilizado gratuitamente uma caixa nova para os meus óculos, a loja não perdeu o valor da caixa – a qual, muito provavelmente, terá sido disponibilizada pela própria Prada sem custos para a loja. No fundo, a loja tratou-me como um amigo e conquistou um cliente para as próximas compras. E a Prada também não ficou a perder.

A EXPERIÊNCIA DO CLIENTE
A qualidade da experiência do cliente é decisiva para as marcas contemporâneas. Um cliente servido com sinceridade e transparência, tratado com amabilidade e empatia e encarado como um valor financeiro da empresa irá seguramente levar consigo memórias positivas da experiência resultante de uma relação comercial justa e mutuamente compensadora. São essas memórias da relação comercial com a empresa que o cliente poderá fazer chegar às pessoas da sua rede de contactos. Rede essa que agora está apenas à distância de um toque suave no ecrã táctil do smartphone.
Se as memórias da experiência de compra e do atendimento anterior e posterior à venda forem positivas, o cliente continuará fiel ao serviço, aumentando, assim, o valor da empresa, uma vez que potencia a conquista de novos clientes e de novos mercados. Pelo contrário, memórias negativas acionam um mecanismo contrário, que pode conduzir à morte das empresas e das marcas. Isso acontece quando o cliente, após uma má experiência com um produto, divulga opiniões negativas sobre esse produto e procura outro, fazendo com que a empresa que o serviu mal possa perder mais clientes e mercado. O que, dada a grande velocidade a que circula a informação atualmente, pode acontecer muito depressa.

O VALOR DE UM CLIENTE
O valor de um cliente não pode ser medido apenas por aquilo que a empresa ganha em cada venda isolada, mas pela soma de todas as transações realizadas ao longo da vida do cliente e das indicações que o cliente pode fazer.
Se imaginarmos quanto um cliente pode gastar numa loja comercial ao longo de toda a vida teremos o valor deste cliente ao longo do tempo. A venda de um jornal diário pode trazer um resultado insignificante para um quiosque de jornais e revistas se for considerada isoladamente; mas pode gerar um resultado muito maior se imaginarmos quantos jornais uma pessoa pode comprar ao longo da sua vida e quantos outros produtos o mesmo cliente pode consumir no quiosque onde se tornou cliente por causa do jornal.
De acordo com esta lógica, o valor do cliente do jornal diário não é o valor resultante de uma única compra, mas o valor de todos os jornais diários que comprar ao longo da vida, mais o valor dos produtos que possa comprar além do jornal diário e dos clientes que o quiosque possa conquistar por ação direta do fiel comprador do jornal.
Sob este prisma, o gerente do quiosque passa a ver o quanto o cliente de um simples jornal diário realmente vale para a gestão do seu negócio. É evidente que, para que todo este potencial possa ser utilizado integralmente, será necessário que o cliente compre sempre o jornal no mesmo quiosque durante toda a vida. É por isso que a fidelização é fundamental.
Um cliente vale muito mais que uma simples compra e quando os funcionários de uma empresa conseguem ver isso, o atendimento melhora significativamente. Um pequeno exercício ajuda a ilustrar esta ideia: uma pessoa que gasta mensalmente 400 euros no hipermercado, supondo que ela começou a fazer as suas compras com 25 anos de idade (pois antes vivia com os pais e as compras eram realizadas pela família) e que viverá até os 77 anos de idade (dados relativos ao período entre 2012 e 2014 indicam que o valor da esperança média de vida à nascença, em Portugal, foi estimado em 80,24 anos para ambos os sexos), no total, ao fim de 52 anos, essa pessoa gastará no hipermercado, ao longo da sua vida, um montante estimado em 250 mil euros. Isto sem contar as possíveis indicações, junto de potenciais novos clientes do supermercado ao longo desse tempo.
Por isso, quando este cliente entra na porta de um hipermercado cada funcionário tem que ver nele um potencial financeiro de 250 mil euros e não apenas alguém que faz compras no valor de 100 euros em cada semana. Esta visão muda toda uma lógica de atendimento e valorização dos clientes, exigindo estratégias de fidelização por parte do hipermercado.

O CLIENTE COMO UM AMIGO PARA A VIDA
Em resumo, conquistar os clientes, mantê-los e cultivá-los, encarando-os como clientes para toda a vida, é um dos grandes mandamentos do marketing estratégico do século XXI. Depois de um marketing centrado no produto e de um marketing orientado para o consumidor, através das vendas, chegou a vez de um marketing movido por valores, que encara o mercado como sendo formado por seres humanos completos, dotados de mente, coração e espírito, que vivem numa sociedade de informação que funciona em rede – onde a informação circula disponível para todos e onde todos podem produzir informação e fazer opinião.
As mudanças económicas, tecnológicas e socioculturais em curso à escala planetária criam oportunidades para os inovadores e constituem uma séria ameaça para aqueles que ignoram essas mudanças. Os mercados, quer os mais pequenos, quer os maiores, estão a tornar-se globais, tendo o cliente como o centro de todas as atividades produtoras de serviços. Seja qual for a missão de uma empresa, o seu negócio é sempre um negócio de serviços, porque a fidelização dos clientes e a conquista de novos clientes implicam que qualquer negócio possua um espírito de querer servir o cliente. O cliente atual é o centro de tudo nas atividades de uma empresa. Podemos dizer que é o cliente quem marca o ritmo das empresas, das marcas e dos produtos. Por isso, as empresas e as marcas têm de ver em cada cliente um amigo para toda a vida. E os amigos, como sabemos, são sempre muito bem tratados.
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