Assembleia Geral Sporting Pavilhão João Rocha
Comunicação Desportiva
19-02-2018

O Sporting e os meios de comunicação

LUÍS PAULO RODRIGUES

Antes de mais, declaro os meus interesses: sou consultor de comunicação, sou associado do Sporting Clube de Portugal, sou um apoiante da gestão do presidente Bruno de Carvalho e, no último sábado, estive na gigantesca assembleia geral leonina, no Pavilhão João Rocha, para votar a favor das propostas da Direcção do clube fundado por José Alvalade e da sua continuidade em funções.

Após cinco anos na presidência do Sporting, Bruno de Carvalho já tem um lugar na história do clube, mesmo sem ter sido campeão no futebol. Em 2013, ganhou as eleições, resgatou o clube ao regime implementado por José Roquette em 1995, conseguiu evitar a falência e o desaparecimento e, mais do que isso, inverteu o caminho seguido até então, fazendo ressurgir o clube como potência desportiva nacional.

Cinco anos depois, o Sporting é um clube desportivamente vencedor, disputando títulos nacionais e europeus em diversas modalidades, ombreando com FC Porto e Benfica; os jogadores de futebol deixaram de ser vendidos a preço de saldo; o pavilhão, prometido há 30 anos, foi construído; as contas ficaram sob controlo; a Sporting TV tornou-se realidade; o Estádio de Alvalade voltou a ser palco do entusiasmo sportinguista; ser sportinguista deixou de ser uma vergonha para voltar a ser motivo de orgulho de norte a sul do país; e até a relva do Estádio de Alvalade deixou de ser um problema.

Bruno de Carvalho só não foi capaz de promover a pacificação interna, tendo contra si uma minoria ruidosa, que se manifesta nas redes sociais e na comunicação social contra o que considera ser um estilo “coreano” ou “trumpiano” de governar o clube. Curiosamente, nenhum dos críticos compareceu na assembleia geral, nem mesmo o candidato derrotado nas últimas eleições, Pedro Madeira Rodrigues, que, estando fora do país, preferiu multiplicar-se em entrevistas.

A assembleia geral de sábado, com uma participação de 6.400 pessoas – afluência de público singular numa assembleia no Sporting e em qualquer outro clube português –, traduziu a aprovação esmagadora da gestão de Bruno de Carvalho e sua equipa, aliás confirmada nas urnas, com as votações favoráveis à direcção a rondarem os 90%.

Com a oposição interna reduzida a um patamar de 10% dos votos, Bruno de Carvalho tinha tudo para sair do Pavilhão João Rocha como um herói, com o respeito e admiração de todos, inclusive da comunicação social, tanto mais que toda a gente achara arriscada a meta dos 75% como percentagem mínima nas votações pedidas pelo presidente para continuar no cargo.

Mas foi neste contexto que Bruno de Carvalho, em vez de ter feito um discurso de vitória, de unidade e de força para o país desportivo, não resistiu à tentação de nomear os meios de comunicação como os novos inimigos do Sporting – como fazia Pinto da Costa há 30 anos, quando se afirmava no FC Porto – recomendando que os sportinguistas deixem de comprar jornais desportivos, de ouvir rádios e de ver televisões, passando a poder ser informados apenas pelos meios de comunicação do clube. Recomendou ainda que os comentadores sportinguistas dos diversos programas desportivos de televisão abandonem os seus lugares.

Ora, ao ter seguido este caminho perigoso, Bruno de Carvalho deitou fora tudo aquilo que tinha alcançado de bom numa assembleia geral grandiosa, demonstradora da força de um Sporting que ele conseguiu reerguer, onde estiveram pessoas vindas de vários pontos do país e onde, ao contrário do que acontecera recentemente no Benfica, não andaram cadeiras pelo ar.

Ao nível da comunicação do Sporting Clube de Portugal, Bruno de Carvalho tinha outro caminho para fazer valer as suas razões de queixa da comunicação social, conquistando o respeito dos jornalistas e do país desportivo.

Aliás, o caminho tomado vai colocar em evidência a sua falta de sentido quando os sportinguistas assistirem aos jogos da Liga Europa na SIC ou da Taça de Portugal na RTP, à revelia das recomendações do presidente. A não ser que se contentem com o relato sem imagens da Sporting TV. O mesmo acontecerá com os comentadores sportinguistas, que estão nos diversos canais pelo seu mérito pessoal, independente do Sporting Clube de Portugal.

Os meios de comunicação são agentes do futebol, tal como os dirigentes ou os jogadores. Os contratos de publicidade – uma das fontes de financiamento dos clubes – são feitos justamente por causa da amplitude que os meios de comunicação conferem às marcas desportivas.

Por outro lado, o jornalismo tem regras deontológicas. Se elas não estão a ser cumpridas, se as notícias publicadas são falsas, se o Sporting ou Bruno de Carvalho não têm tido direito ao contraditório, e se as opiniões são infames e ultrajantes, existem organismos de regulação do trabalho de jornalistas e comentadores e existem tribunais.

Bruno de Carvalho, em vez de ter pedido boicotes a jornais, rádios e televisões deveria ter anunciado a criação de uma equipa jurídica, que inclua analistas de jornalismo e de comunicação digital, cujo trabalho seria inundar a Entidade Reguladora para a Comunicação Social (ERC) e os tribunais com queixas, participações e processos-crime, sempre que o Sporting e os seus dirigentes fossem prejudicados na arena mediática. É assim que as coisas devem funcionar num Estado de direito democrático.

Se este trabalho de comunicação fosse feito em Alvalade, o Sporting Clube de Portugal e o seu presidente ganhariam o respeito da classe jornalística e dos comentadores. Porque os prevaricadores perderiam tanto tempo e tanto dinheiro em processos que passariam a ter mais cuidado na hora de escrever notícias ou tecer comentários.

Obs. – Artigo publicado no jornal Meios & Publicidade, em 19 de fevereiro de 2018. Link original: goo.gl/Lwh16x.
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