Pensamentos & Ideias
10-01-2016

Zygmunt Bauman. “As redes sociais são uma armadilha”

Em 1963, o sociólogo polaco Zygmunt Bauman (Poznan, 1925) foi afastado da Universidade de Varsóvia por causa das suas ideias, consideradas subversivas para o regime comunista. Hoje, com 90 anos, é imigrante em Londres. É considerado um dos grandes pensadores mundiais sobre o declínio da civilização. Democracia, Liberdade, Segurança e Redes Sociais foram temas em destaque numa entrevista que concedeu ao jornal espanhol “El País”.

“O que está acontecendo agora, o que podemos chamar de crise da democracia, é o colapso da confiança. A crença de que os líderes não só são corruptos ou estúpidos, mas também incapazes. Para atuar, é necessário poder: ser capaz de fazer coisas; e política: a habilidade de decidir quais são as coisas que têm ser feitas. A questão é que esse casamento entre poder e política nas mãos do Estado-Nação acabou. O poder globalizou-se, mas as políticas são tão locais quanto antes. A política tem as mãos cortadas. As pessoas já não acreditam no sistema democrático porque ele não cumpre as suas promessas. É o que está evidenciando, por exemplo, a crise migratória. O fenómeno é global, mas atuamos em termos paroquiais. As instituições democráticas não foram estruturadas para conduzir situações de interdependência. A crise contemporânea da democracia é uma crise das instituições democráticas.”

“[Liberdade e segurança] são dois valores extremamente difíceis de conciliar. Para ter mais segurança é preciso renunciar a certa liberdade, se você quer mais liberdade tem que renunciar à segurança. Esse dilema vai continuar para sempre. Há 40 anos, achamos que a liberdade tinha triunfado e que estávamos no meio de uma orgia consumista. Tudo parecia possível mediante a concessão de crédito: se você quer uma casa, um carro... pode pagar depois. Foi um despertar muito amargo, o de 2008, quando o crédito fácil acabou. A catástrofe que veio, o colapso social, foi para a classe média, que foi arrastada rapidamente ao que chamamos de precariat (termo que substitui, ao mesmo tempo, proletariado e classe média). Essa é a categoria dos que vivem numa precariedade contínua: não saber se as suas empresas vão fundir-se ou comprar outras, ou se vão ficar desempregados, não saber se o que custou tanto esforço lhes pertence... O conflito, o antagonismo, já não é entre classes, mas de cada pessoa com a sociedade. Não é só uma falta de segurança, também é uma falta de liberdade.”

“(…) Não se cria uma comunidade, você tem uma ou não; o que as redes sociais podem gerar é um substituto. A diferença entre a comunidade e a rede é que você pertence à comunidade, mas a rede pertence a você. É possível adicionar e deletar amigos, e controlar as pessoas com quem você se relaciona. Isso faz com que os indivíduos se sintam um pouco melhor, porque a solidão é a grande ameaça nesses tempos individualistas. Mas, nas redes sociais, é tão fácil adicionar e deletar amigos que as habilidades sociais não são necessárias. Elas são desenvolvidas na rua, ou no trabalho, ao encontrar gente com quem se precisa ter uma interação razoável. Aí você tem que enfrentar as dificuldades, envolvendo-se num diálogo. O Papa Francisco, que é um grande homem, ao ser eleito, deu a sua primeira entrevista a Eugenio Scalfari, um jornalista italiano que é um ateu autoproclamado. Foi um sinal: o diálogo real não é falar com gente que pensa igual a você. As redes sociais não ensinam a dialogar porque é muito fácil evitar a controvérsia… Muita gente usa-as não para unir, não para ampliar os seus horizontes, mas ao contrário, para se fechar no que eu chamo de zonas de conforto, onde o único som que escutam é o eco de suas próprias vozes, onde a única coisa que veem são os reflexos das suas próprias caras. As redes são muito úteis, oferecem serviços muito satisfatórios, mas são uma armadilha.”

Zygmunt Bauman, em entrevista ao jornal “El País”, 08-01-2016. Link: http://goo.gl/8zFgiR.
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