Jornalismo
27-02-2014

O futebolista Carlos Mané, tráfico de droga e manipulação grosseira

LUÍS PAULO RODRIGUES

Em Loures, há um homem que está à espera de ser julgado em tribunal, acusado de ser líder de uma alegada rede de tráfico de droga. A notícia é hoje manchete do jornal popular “Correio da Manhã”, que é o mais lido em Portugal.

Na primeira página, o “Correio da Manhã” não menciona o nome do alegado traficante, nem sequer coloca a sua fotografia. Por uma razão muito simples: o jornal não iria vender nenhum exemplar se o fizesse, pois ninguém conhece o indivíduo. Traficantes de droga à espera de julgamento haverá muitos e este será apenas mais um deles. Ou seja, se fosse notícia, seria uma breve escondida na secção dos casos do dia.

Acontece, porém, que a pessoa em causa é pai do jogador de futebol Carlos Mané – um facto sublinhado duas vezes nas duas frases da primeira página!... –, o novo talento das escolas do Sporting Clube de Portugal, que é um dos jogadores do momento em Portugal, que não tem nada a ver com o caso que dá origem à notícia que se destaca na capa do jornal.

A questão é que Carlos Mané é famoso, joga num clube grande e qualquer notícia em que apareça associado o seu nome passa a ter um valor que não tinha, suscitanto nos leitores o interesse na compra do jornal. E se o nome de Carlos Mané aparecer ligado a um caso de tráfico de droga, então estão criadas as condições perfeitas para uma manchete, se o jornal não tiver ética, nem responsabilidade social, como parece ser o caso do jornal da Cofina.

Estamos perante um caso de manipulação grosseira do “Correio da Manhã”, que, provavelmente, passará impune. Atropelando a ética jornalística e as regras do jornalismo, o "Correio da Manhã" procura apenas vender jornais, valorizando a notícia sobre um alegado criminoso com a figura de alguém famoso que, aparentemente, não tem nada a ver com o assunto. De resto, é um estratagema recorrente nesse jornal, que se aproveita da desinformação ou passividade dos envolvidos.

Sejamos claros: a manchete “Pai de Mané em fuga por tráfico de droga” e o pós-título “Cabecilha de rede que vai a julgamento em Loures é o pai da pérola leonina”, com a fotografia de Carlos Mané, que não pode ser responsabilizado pelos atos do pai, nem autorizou a publicação da a fotografia a ilustrar tal notícia, é um caso gravíssimo de atentado contra a pessoa de Carlos Mané, que, independentemente de ser uma figura pública, tem direito ao seu bom nome, não podendo ser misturado no espaço público mediático com atos eventualmente criminosos de terceiros, neste caso, do seu pai. É também, obviamente, um atentado contra ao jornalismo ético e responsável.

Tanto na manchete como no pós-título o “Correio da Manhã” menciona duas vezes o facto de estar em causa o pai do craque do Sporting. Carlos Mané deveria, por isso, acionar criminalmente o jornal “Correio da Manhã”. E o Sporting Clube de Portugal deveria fazer o mesmo, pois a imagem do clube também é chamuscada, dado que a camisola verde e branca de Carlos Mané remete a mente dos leitores para o universo sportinguista.

Independentemente disso, a Entidade Reguladora para a Comunicação Social (ERC), presidida pelo jornalista Carlos Magno, também não pode ficar de braços cruzados. Deveria tomar a iniciativa de intervir neste caso. Em jornalismo não pode valer tudo. É tempo de acabar com a impunidade de certa imprensa, que mais parece ser produzida por abutres.
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